Giro Global #20: Ibovespa reage a incertezas fiscais com forte queda
- Leonardo Strambi, CFA

- 21 de nov. de 2022
- 5 min de leitura
Ibovespa cai -3,0%, em meio a preocupações com a condução da política fiscal do próximo governo.
Cenário Macro
Juros americanos seguem trajetória de alta. Mercado reagiu às afirmações de Mary Daly, presidente do Fed de São Francisco, de que uma pausa nas altas dos juros está fora de cogitação e James Bullard, presidente do Fed de St. Louis, que reforçou que os juros devem alcançar ao menos 5%, ou 5,25% a.a. para conter a inflação.

A última semana foi marcada pelas preocupações com a composição da equipe de transição do novo governo, em especial na área econômica, onde o mercado aguarda a indicação do próximo ministro da economia. O PT divulgou uma lista de 290 indicados para coordenar o processo. Além do tamanho da lista, a presença de nomes controversos como Guilherme Boulos, Guido Mantega (que renunciou o convite, após forte reação negativa do mercado à sua indicação), Aloisio Mercadante e Gleisi Hoffman, chamou a atenção.
Outro ponto de atenção importante foi a discussão sobre a 'PEC da Transição'. As diversas sinalizações de Lula e outros integrantes da transição, para uma política desenvolvimentista que não priorizaria a responsabilidade fiscal reacenderam o risco de desequilíbrio das contas públicas, com reação negativa do mercado: bolsa caindo, juros e dólar subindo.
Destaco uma citação de Lula, na COP27, que repercutiu bastante: "Se eu falar isso, vai cair a bolsa, o dólar vai aumentar? Paciência. O dólar não aumenta e a bolsa não cai por conta das pessoas sérias, mas por conta dos especuladores que vivem especulando todo santo dia".
Arminio Fraga, Pedro Malan e Edmar Bacha publicaram carta crítica ao presidente eleito, na tentativa de explicar que a responsabilidade fiscal não é um obstáculo à responsabilidade social e que justamente as classes mais desfavorecidas são sempre as mais prejudicadas pelo desastre econômico causado pela irresponsabilidade fiscal.
Confira a carta na íntegra:
“Caro presidente eleito Lula,
Assistimos a sua fala nesta quinta (17) cedo na COP27, no Egito. Acredite que compartilhamos de suas preocupações sociais e civilizatórias, a sua razão de viver. Não dá para conviver com tanta pobreza, desigualdade e fome aqui no Brasil.
O desafio é tomar providências que não criem problemas maiores do que os que queremos resolver.
A alta do dólar e a queda da Bolsa não são produto da ação de um grupo de especuladores mal-intencionados. A responsabilidade fiscal não é um obstáculo ao nobre anseio de responsabilidade social, para já ou o quanto antes.
O teto de gastos não tira dinheiro da educação, da saúde, da cultura, para pagar juros a banqueiros gananciosos. Não é uma conspiração para desmontar a área social.
Vejamos por quê.
Uma economia depende de crédito para funcionar. O maior tomador de crédito na maioria dos países é o governo. No Brasil o governo paga taxas de juros altíssimas. Por quê? Porque não é percebido como um bom devedor. Seja pela via de um eventual calote direto, seja através da inflação, como ocorreu recentemente.
O mesmo receio que afeta as taxas de juros afeta também o dólar. Imagino que seja motivo de grande frustração ver isso tudo. Será que o seu histórico de disciplina fiscal basta? A verdade é que os discursos e nomeações recentes e a PEC (proposta de emenda à Constituição) ora em discussão sugerem que não basta. Desculpe-nos a franqueza. Como o senhor sabe, apoiamos a sua eleição e torcemos por um Brasil melhor e mais justo.
É preciso que se entenda que os juros, o dólar e a Bolsa são o produto das ações de todos na economia, dentro e fora do Brasil, sobretudo do próprio governo. Muita gente séria e trabalhadora, presidente.
É preciso que não nos esqueçamos que dólar alto significa certo arrocho salarial, causado pela inflação que vem a reboque. Sabemos disso há décadas. Os sindicatos sabem.
E também não custa lembrar que a Bolsa é hoje uma fonte relevante de capital para investimento real, canal esse que anda entupido.
São todos sintomas da perda de confiança na moeda nacional, cuja manifestação mais extrema é a escalada da inflação. Quando o governo perde o seu crédito, a economia se arrebenta. Quando isso acontece, quem perde mais? Os pobres!
O setor financeiro recebe juros, sim, mas presta serviços e repassa boa parte dos juros para o resto da economia, que lá deposita seus recursos.
O teto, hoje a caminho de passar de furado a buraco aberto, foi uma tentativa de forçar uma organização de prioridades. Por que isso? Porque não dá para fazer tudo ao mesmo tempo sem pressionar os preços e os juros. O mundo aí fora está repleto de exemplos disso.
Então por que falta dinheiro para áreas de crucial impacto social? Porque, implícita ou explicitamente, não se dá prioridade a elas. Essa é a realidade, que precisa ser encarada com transparência e coragem.
O crédito público no Brasil está evaporando. Hora de tomar providências, sob pena de o povo outra vez tomar na cabeça.
Respeitosamente,
Arminio Fraga, Edmar Bacha e Pedro Malan”
Em meio a esses ruídos, o Morgan Stanley rebaixou recomendação de ações do Brasil, de 'Overweight' para 'Neutra', conforme publicou o TC:

Na China, foco segue na pandemia, à medida em que a situação da COVID piora. Após o primeiro falecimento desde maio, novas regiões passarão por testagem em massa e lockdowns.
Nos EUA, os pronunciamentos mais duros de membros do Federal Reserve sobre o rumo da taxa de juros afetaram o apetite por risco dos investidores com as bolsas americanas terminando no negativo também.
Bancos centrais em ação
Os principais headlines de política monetária ao redor do mundo na semana.
Fed officials keep rate-hike pivot on the radar despite strong jobs data
Fed says financial system holding up through turbulent year
U.S. jobs picture mixed as Fed policymakers ponder rate-hike pivot
Bank of England trying to curb inflation without too much pain-Pill
Bank of England raises rates by most since 1989 even as long recession looms
Philippine c.bank ready to take further action as inflation near 14-yr high
O que esperar para a próxima semana
No cenário internacional, a ata do Comitê de Política Monetária dos EUA (FOMC) e dados de atividade de outubro e novembro nos países desenvolvidos devem impactar os mercados.
No Brasil, notícias relacionadas à PEC de Transição e a possíveis quadros que podem integrar o governo a partir do ano que vem seguem como principal tema para o mercado. No campo de dados econômicos, dados fiscais e de setor externo referentes a outubro, assim como a prévia da inflação de novembro serão destaque
Uma excelente semana e bons negócios.
Leonardo Strambi
Fundador e Assessor de Investimentos na Austria Capital
*Opiniões e análises pessoais, que não refletem necessariamente visões institucionais, nem se configuram como recomendação de investimento.
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